quarta-feira, 4 de agosto de 2010

O ENSAIO ABERTO I

Por Rodrigo Dourado (Diretor)

Em 08 de Dezembro do ano passado, fizemos um ensaio aberto de CHAT, dentro da Mostra Capiba de Teatro, do Sesc Casa Amarela. Foi um momento decisivo para o grupo, para mim, para todos. Estávamos trabalhando desde abril, tínhamos pensando várias vezes em datas para estreia, submetemos um projeto de temporada ao Capiba e desistimos. Foi um período difícil, eu estava meio obcecado com a ideia de não virar 2009 sem apresentar qualquer resultado do trabalho. Tudo era muito instável, ficamos sem produtor, a cena ainda estava em plena construção, nada estava fechado e era muito difícil concluir um trabalho de direção de arte com a cena ainda aberta daquele jeito e eu tive de assumir tudo, junto com os atores. Para eles, foi um aprendizado de pedra, pq não estava no nosso acordo que eles teriam de assumir outras funções que não a de atores.

Foi um enorme aprendizado para mim como diretor. Primeiro, nosso trabalho de dissecação do texto foi maravilhoso. Fizemos um aprofundamento enorme, com todos presentes - inclusive Wellington - debatemos todas as temáticas do texto - políticas, religiosas, econômicas, etc. - investigamos as personagens a partir do modelo actancial de Greimas/Ubersfeld - isso porque eu já tinha em mente que minha abordagem não seria psicologizante, mas política e épica. Desmontamos o texto, duvidamos das personagens, investigamos as fragilidades da dramaturgia, debatemos as possíveis transposições para a cena. Assistimos filmes, buscamos as referências literárias do texto, como Blake. Lemos, lemos, lemos. Inflexões, entonações, imagens, climas, personas. E, então, pulamos para construir as cenas. Esse foi meu primeiro erro, imaginar que meus atores conseguiriam saltar de uma fase meramente textual/verbal/intelectual para a fisicalidade/afetividade da cena e das personagens. Não seria tão fácil.

Na sala de ensaios, comecei a propor que as cenas fossem construídas tomando por base a ideia do estranhamento das formas. Não queria que fossem criadas a partir da relação homem/computador – máquina, como está indicado no texto: personagens (no I ATO) tendo à frente teclados de computador e os diálogos se dando dessa maneira. Eu achava que as cenas tinham tanta teatralidade, que mereciam outras formas, mais vivas. E que nossas cenas deveriam sugerir outras perspectivas, outros ângulos de visão para aqueles diálogos e situações. Abandonando, assim, a noção de que as personagens não se viam, não se tocavam, estavam apartadas e protegidas atrás do monitor. Para mim, mesmo no CHAT, os encontros aconteciam, as pessoas se tocavam. Mas esses encontros se davam não de forma realista, mas de maneira teatral, com as personagens/nicks/pessoas se transformando em tipos/forças. Com aquelas fantasias da CHAT transformando-se em TEATRO, numa espetacularidade manifesta, exposta. Deixando assim uma abordagem meramente psicológica e algo realista (o que geraria algum conforto para a plateia) na direção de uma abordagem estranhada, política e não realista (o que demandaria da plateia uma postura ativa e refelxiva).

A ideia também era colar outras camadas de sentido aos diálogos e aos encontros, estranhando-os, colocando em risco as palavras, duvidando e reelaborando as informações das falas e criando outras situações. E assim, fizemos, tudo com o objetivo de superar uma leitura aligeirada da dramaturgia, das personagens e obstruir qualquer leitura superficial da plateia. Queríamos que a plateia estranhasse a forma, com o objetivo de acordá-la, despertá-la para os conteúdos. Especialmente porque os temas que a peça aborda são muito reconhecíveis, estão no noticiário diariamente, há uma saturação deles. Assim precisávamos, politicamente, aprofundar o debate, desmontar as representações cotidianas dos temas e das personagens, e para isso era extremamente necessário estranhar as formas. Tudo muito brechtiano. (Continua...)

Imagem do ensaio aberto:

Um comentário:

  1. Como me deliciei lendo seu post, tudo fica melhor ainda porque assisti ao espetáculo, as fichas caem com mais sabor.
    EvoÉ!
    Muita merda pra vcs!

    ResponderExcluir